Por Renato Cantoni
Os recentes ataques cibernéticos que comprometeram a segurança de dados de milhões de brasileiros e resultaram no desvio bilionário de recursos do sistema financeiro nacional expõem, de forma contundente, as fragilidades estruturais provocadas pela terceirização indiscriminada no serviço público. De acordo com as informações divulgadas pela Polícia Civil e amplamente noticiadas pela imprensa nacional, o ponto de ruptura da segurança ocorreu a partir da ação de um trabalhador terceirizado, que repassou credenciais de acesso a criminosos virtuais, facilitando um dos maiores crimes cibernéticos da história recente do país.
Não se trata apenas de uma falha individual, mas do reflexo de uma política que precariza o serviço público, esvazia a função do Estado e desvaloriza seus quadros técnicos. A terceirização de áreas sensíveis e estratégicas, como a Tecnologia da Informação e a Segurança Institucional, não representa eficiência — representa vulnerabilidade. E o resultado está aí: bilhões desviados, dados comprometidos, serviços suspensos e a confiança da população abalada.
É preciso dizer com todas as letras: a segurança da informação e a proteção das instituições públicas devem estar nas mãos de servidores concursados, qualificados, comprometidos com o interesse público e submetidos a rigorosos mecanismos de controle e responsabilidade. São esses profissionais que, ao longo dos anos, sustentam o funcionamento do Estado, garantindo sua continuidade, legalidade e integridade, mesmo diante de crises ou mudanças de governo.
No Ministério Público da União, a atuação dos servidores da área de Tecnologia da Informação é estratégica e imprescindível. São esses profissionais que garantem a integridade e o funcionamento dos sistemas eletrônicos judiciais, a proteção de dados sensíveis e o sigilo das investigações. Em um cenário de mais de dois milhões de ataques cibernéticos por dia, em média, contra as estruturas do MPU, substituir esses servidores por contratos temporários, mal remunerados e sem o comprometimento institucional adequado representa um risco gravíssimo à segurança da informação e à confiabilidade do sistema de Justiça.
Esse mesmo processo de terceirização tem avançado em outras áreas do MPU, afetando também diversas especialidades das categorias de servidores dos quadros do MPU, como os gabinetes e a inovação jurídica dos residentes, além dos Peritos e Policiais do Ministério Público que atuam diretamente na proteção de seus integrantes (membros, servidores, colaboradores e todos as demais pessoas envolvidas com o mister constitucional do MPU) e no suporte ao funcionamento da instituição. Ao priorizar vínculos precários em detrimento de servidores concursados, o Ministério compromete sua missão constitucional, enfraquece seu corpo técnico e abre uma perigosa porta de entrada para falhas, sabotagens e crimes.
Não há Estado forte com servidor fraco. Não há combate à corrupção sem estruturas sólidas. Não há prestação de serviço de qualidade sem valorização de quem o executa. E não há proteção ambiental, defesa dos povos indígenas ou garantia de direitos difusos sem servidores públicos preparados, estáveis e comprometidos com o interesse coletivo.
Neste momento, em que o país debate segurança digital, ciberdefesa e proteção dos dados da população, é hora de dar nome aos responsáveis pelas falhas estruturais: a lógica de mercado aplicada à gestão pública, que enxerga o Estado como empresa e seus trabalhadores como meros custos a serem reduzidos. É importante reafirmar que essa lógica fracassou.
Por isso, o Sindicato Nacional dos Servidores do Ministério Público da União (SindMPU) reafirma sua posição histórica: a defesa intransigente do serviço público, a valorização dos seus quadros técnicos e a imediata revisão de todos os processos de terceirização nas áreas estratégicas e finalísticas do MPU. É hora de investir nos servidores, garantir concursos públicos, formar equipes permanentes e construir uma política de carreira que fortaleça o papel do Estado como garantidor dos direitos fundamentais e da soberania nacional.
Não podemos aceitar que a irresponsabilidade gerencial se torne rotina. O que está em jogo é muito mais do que dados ou recursos financeiros: é a confiança da sociedade no poder público.